NA DIÁSPRA ANGOLANA NÃO EXISTEM… BRANCOS

Um Sistema Geral de Gestão Consular (SIGGEC), plataforma digital para assegurar maior integração, modernização, descentralização e operacionalidade dos serviços consulares, está a ser implementado pelo Executivo angolano, com vista a um melhor atendimento às comunidades no exterior do país.

A iniciativa insere-se no investimento que o Executivo tem feito no âmbito dos novos mecanismos que visam concretizar a transição digital da administração pública, segundo o embaixador de Angola na Etiópia, Miguel Bembe, que discursava terça-feira, 12 de Agosto, em Adis Abeba, na cerimónia de apresentação à comunidade angolana neste país.

O diplomata afirmou que o Executivo está empenhado em conduzir um levantamento estatístico, a identificação do estatuto social e a situação migratória, social e familiar das comunidades angolanas na diáspora.

Citando – como não poderia deixar de ser num regime de culto sagrado do chefe – o Presidente da República, general João Lourenço, Miguel Bembe lembrou que “(…) o angolano, esteja onde estiver, é um activo que merece o nosso conforto, sendo portador de direitos e deveres iguais aos de quem reside no interior do país”. Isto só se aplica aos que o MPLA (no Poder há 48 anos) considera angolanos, deixando por isso de fora muitos milhares de angolanos.

“Neste sentido, lanço um repto e encorajo a todos os presentes para que, num futuro próximo, possamos testemunhar a criação da Associação dos Angolanos e Amigos de Angola na Etiópia. Da minha parte, asseguro o apoio institucional da Missão Diplomática, ”referiu Miguel Bembe, que é também representante permanente de Angola junto da União Africana (UA) e da Comissão Económica das Nações Unidas para a África (UNECA).

O embaixador manifestou disponibilidade para interagir com a comunidade na promoção de um diálogo inclusivo, para abordar questões prementes, valorizar, preservar e assistir as comunidades angolanas no exterior.

No seu ponto vista, é importante haver iniciativas conjuntas, como actividades ocupacionais para cônjuges, de educação sobre história, geografia e literatura angolana, bem como o ensino da língua portuguesa aos filhos.

No dia 25 de Novembro de 2018, a então ministra da Cultura de Angola, Carolina Cerqueira, disse em Lisboa que Luanda iria tornar-se, em 2019, a capital mundial da paz e da amizade entre os povos dos cinco continentes e a diáspora.

Para o MPLA, mas também para a UNITA, não há angolanos, angolanos “puros”, que sejam brancos.

Discursando durante uma confraternização com artistas e representantes devidamente seleccionados da comunidade angolana em Portugal, no âmbito da Semana Cultural de Angola em Portugal, Carolina Cerqueira indicou que o convite foi feito pela Directora-geral da UNESCO, Andrew Azulay, durante a visita do Presidente João Lourenço à sede da instituição, em Julho desse ano (2018).

Segundo a governante, João Lourenço aceitou o convite “de imediato” e garantiu todo o apoio para o sucesso do evento.

“A escolha de Angola comprova o respeito e credibilidade que o nosso país goza a nível internacional na defesa da paz, da amizade e fraternidade entre os povos, assente numa base de diálogo, de mutualismo e de concertação”, sublinhou Carolina Cerqueira.

Nesse sentido, e dirigindo-se à plateia, a então ministra da Cultura angolana apelou aos membros da diáspora para “continuarem a dignificar” Angola nos actos e iniciativas que contribuam para “reafirmar a grandeza da alma e identidade angolanas, através de modelos de resiliência, generosidade e determinação, qualidades que os caracterizam”.

Para Carolina Cerqueira, o novo ciclo político que o país então conhecia “requer de todos o patriotismo e o comprometimento com a defesa do bem comum e do interesse nacional”.

A semana cultural em Portugal, em saudação à visita do presidente João Lourenço, contou com várias manifestações culturais como moda, gastronomia, música, pintura, dança, artes plásticas e literatura, que contaram, entre outros, com a participação de artistas como Waldemar Bastos, Té Macedo, Nadir Tati, Etona, Edy Tussa, Maria Borges, Rose Palhares e Guilherme Guizefe.

Carolina Cerqueira salientou – como acima se escreveu – “o respeito e credibilidade que o nosso país goza a nível internacional na defesa da paz, da amizade e fraternidade entre os povos, assente numa base de diálogo”, apelando também aos membros da diáspora para “continuarem a dignificar” Angola nos actos e iniciativas que contribuam para “reafirmar a grandeza da alma e identidade angolanas, através de modelos de resiliência, generosidade e determinação, qualidades que os caracterizam”.

Diáspora significa “dispersão de um povo ou de uma comunidade ou de alguns dos seus elementos”. Ora então, pelo que se viu por mais este exemplo, não há brancos na diáspora angolana em Portugal. Ou há mas seriam “persona non grata” para o MPLA?

Ser ou não ser… angolano

Vejamos um depoimento feito ao Folha 8 mas cujo anonimato mantemos por razões óbvias, desde logo porque o autor não é do MPLA, e que aqui foi publicado no dia 14 de Novembro de 2018:

“Eu como sou branco e filho de portugueses não posso ter a nacionalidade Angolana por embora ter nascido em Angola, ser na lógica da actual direcção do país, filho de cidadãos estrangeiros. Ora de facto, à data da independência, e face ao direito internacional, não havia angolanos, todos eram portugueses.

No fundo para muita daquela malta (negra), que aliás faz gala de se intitular genuína, nós os brancos nados em Angola não somos angolanos. Para ser angolano teria de andar a dizer ámen ao MPLA e ser mais negro do que os negros. Mas eu sou branco e culturalmente não tenho nado de bantu. É a vida. Ou se assume um país multirracial ou não. E os ditos genuínos, claramente não assumem tal conceito de um país multirracial. Eu pertenço à tribo branca, mas como em Angola não existiu nem nunca existirá um Mandela, a tribo branca está condenada ao ostracismo.

Os tais auto-intitulados genuínos não perceberam que o conceito de angolanidade apareceu por oposição ao conceito de portugalidade. E que até à chegada dos portugueses àquelas regiões, não havia Angola, mas uma série de reinos que se guerreavam. Angola, goste-se ou não da ideia, é uma criação do colonialismo português com todas as implicações, culturais, sociais, históricas e rácicas, sejam elas boas ou más. É a História. Mas há muito boa gente que quer apagar tal passado apropriando-se do tal conceito de genuinidade. Mas depois bem que colocam o graveto na terra dos tugas. Enfim, tudo como dantes…

Um exemplo do racismo negro foi o que se passou com o Viriato da Cruz, mulato, dirigente do MPLA e um dos maiores intelectuais angolanos. Mas como não era negro, vulgo genuíno, lá teve de entregar a direcção do movimento ao anormal e criminoso do Agostinho Neto, que era genuíno quanto bastava.”

Tomamos, aliás, a liberdade de recontar à ministra Carolina Cerqueira um episódio passado no dia 28 de Julho de 2007.

Nesse dia, na Faculdade de Economia do Porto realizou-se uma conferência sobre o processo eleitoral em Angola. Caetano de Sousa, presidente da Comissão Nacional Eleitoral (CNE), foi o orador principal do evento ao qual compareceram cerca de 200 angolanos de primeira e mais meia dúzia de segunda.

Com uma hora de atraso, o encontro começou com o aplauso da assistência à entrada do então Embaixador de Angola, Assunção Afonso Sousa dos Anjos, bem como das cônsules em Lisboa e no Porto, respectivamente Elisabeth Simbrão e Maria de Jesus dos Reis Ferreira, e ao orador convidado.

Por deficiências sonoras, que nada preocuparam a assistência, pouco se percebeu do que disse o Embaixador ou do que afirmou Caetano de Sousa. Também é certo que, diga-se em abono da verdade, que abandonámos a sessão no início da intervenção do presidente da CNE.

E abandonámos a sessão porque descobrimos que, afinal, o nosso lugar não era ali. E descobrimos isso graças à oportuna explicação de gente ligada à organização, presumimos que do Consulado no Porto.

Explicamos. No meio dos tais 200 cidadãos presentes estavam pouco mais de meia dúzia de brancos. Durante a sessão, algumas pessoas foram distribuindo pela assistência um pequeno papel que tempos depois recolhiam. Presumimos que se tratava de perguntas sobre o processo eleitoral e destinadas aos oradores.

Reparamos então (talvez por deficiência profissional) que esses papéis não eram entregues aos cidadãos brancos que, se não eram angolanos eram, pelo menos, amigos de Angola. Não cremos que estivessem ali como penetras apenas para o faustoso beberete que estava a ser montado para o fim da festa.

Interpelámos então uma das pessoas que distribuía os ditos papéis, perguntando-lhe se não tínhamos direito a um deles.

A resposta foi clara e inequívoca:

“- Isto é só para angolanos”.

A tradução desta afirmação é fácil, já que nenhum dos 200 cidadãos presentes trazia qualquer rótulo a dizer: “Sou angolano”. Ou seja, queria dizer: “Isto é só para angolanos negros”.

Assim sendo, e porque somos angolano… mas branco, não tivemos outro remédio que não fosse abandonar a sala. Tristes, é certo. Magoados, é claro. Mas como nada nos é possível fazer quanto ao local em que nascemos, ao país que amamos, e muito menos quanto à nossa cor, a solução foi ir embora.

Entretanto, o Presidente da UNITA, Adalberto da Costa Júnior, reuniu no dia 21 de Janeiro deste ano, com os militantes (quadros) residentes em Lisboa. O líder da UNITA, recordou os momentos vividos nas eleições gerais de 24 de Agosto de 2022. Sobre as autarquias locais, Adalberto Costa Júnior, partilhou perspectivas do seu partido no quadro da preparação das eleições autárquicas. Por fim, o líder da UNITA, agradeceu o voto depositado pelos angolanos residentes em Portugal.

Como sempre disse o MPLA, essa ideia de que a UNITA tem militantes (quadros) brancos em Portugal é treta.

Conclusão, para o MPLA e para a UNITA, não há angolanos, angolanos mesmo (puros) que sejam brancos.

Em 1975, já com o país em guerra acelerada, o Presidente da UNITA, Jonas Savimbi, teve, em Nova Lisboa, vários encontros com jovens filiados na UNITA. Foi-lhes dito que a UNITA iria ganhar a guerra e que, mais cedo ou mais tarde, seria governo.

“Nesta altura a nossa preocupação é formar militares, mas temos de pensar mais à frente, porque quando for governo, a UNITA não vai ter um governo de generais. Por isso, temos de formar engenheiros, professores, médicos, enfermeiros, arquitectos, gestores, economistas, juristas, escritores etc. porque serão esses os futuros governantes. Ora, muitos de vocês podem ser militares, mas é mais importante que estudem para, mais tarde darem o vosso contributo ao país. E como muitos têm ligação directa a Portugal, devem ir para lá e prosseguir os estudos. Quando chegar a altura vão regressar porque vocês são angolanos como eu”, disse-lhes Jonas Savimbi.

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